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Ler e escrever: possibilidades e vivências na prática cotidiana da Educação Infantil

Autora: Luiza Fernanda Dias dos Santos​ 


Em consonância com a BNCC, a proposta que será apresentada a seguir permeia o campo de experiência que atende a escuta, fala, pensamento e imaginação, que visa valorizar e ampliar o repertório linguístico das crianças. Um outro campo abordado a ser explorado é o eu, o outro, e o nós, que busca ofertar diferentes contextos a fim de possibilitar um diálogo pautado nas observações individuas e compartilhadas no dia a dia.

A prática diária de ler, escrever e possibilitar a exploração de materiais riscantes é vital para a apropriação das diferentes linguagens e o seu domínio progressivo, ação garantida nas Orientações Curriculares Nacionais para a Educação Infantil art. 9º inciso III (BRASIL, 2010).

Levando em consideração a importância de ser um momento lúdico, divertido e prazeroso para as crianças, foi elaborada uma atividade com “papel mágico” (cartolina envelopada com plástico autocolante) em que nele a criança faz o seu registro de escrita espontânea ou desenho, dependendo do que está sendo proposto. Em seguida, pode apagar com o dedo usando seus “poderes mágicos” (é usado marcador para quadro branco que se apaga facilmente).

A escrita das informações do dia também pode ser feita no “papel mágico”, momento em que as crianças relatam informações do dia (o nome da unidade, o dia da semana, entre outras), enquanto é feito o registro pelo adulto escriba diante do grupo.

Após esse momento, as crianças são convidadas a usar seu super poder do “dedo mágico” e apagar as informações escritas. A empolgação é nítida e, como a ação se tornou uma rotina, as crianças exploram possibilidades para apagar o que foi escrito: alguns apagam letra por letra, outros seguem o fluxo da esquerda para a direita que no caso faz relação com a forma como foi escrito.

O intuito dessa atividade é ofertar momentos em que o uso da palavra escrita ganhe função real no cotidiano. Segundo Soares (2021), “a criança aprende a ler e escrever envolvendo-se em atividades de letramento, isto é, de leitura e produção de textos reais, de práticas sociais de leitura e de escrita.”

Para Brandão e Rosa (2011), “na educação infantil são inúmeras as oportunidades significativas em que as crianças podem reconhecer letras, aprender os nomes de cada uma e grafá-las” assim, vão tomando consciência do uso das letras que se se transformam em palavras, textos e afins.

Nesta perspectiva, o nome é uma ferramenta carregada de afetividade e possibilidades. Logo, tem presença certa em alguns momentos do cotidiano em que sua escrita é vivenciada de diversas formas, a fim de explorar suas potencialidades.

Aliada a diferentes suportes didáticos e estéticos, é possível averiguar a estrutura dos nomes para que se crie possibilidades de experenciar a palavra escrita de outras formas.

Fonte: Acervo pessoal da autora

 

A exemplo disso está uma outra prática:  a “caça” às letras do nome. Nestes momentos fica disposto aos pequenos várias letras previamente recortadas e eles ficam incumbidos de procurar as que compõem seu nome, usando a ficha da chamada como recurso de ajuda. Após finalizado o desafio de busca, as crianças são convidadas a colar de forma ordenada as letras em uma folha. Neste momento, elas investigam a estrutura das letras e fazem a colagem seguindo a ordem de seus nomes.

Essa interação demanda atenção e paciência por parte dos pequenos, o que não impede que seja uma atividade lúdica e prazerosa. A todo momento é reforçada sua capacidade em chegar ao objetivo proposto e é notório o quanto eles ficam empolgados com o desafio, além de apreciar o que foi construído por eles.

Com o intuito de ampliar a oralidade dos pequenos e seu repertório linguístico, é de suma importância promover momentos em que se possa explorar diferentes formas de abordar a cultura oral. “É comum, nas salas de educação Infantil, observarmos atividades de conversa, hora da novidade, contação de histórias, entre outras situações que buscam estimular o desenvolvimento da linguagem oral” (BRANDÃO; ROSA, 2011).

Por isso, tendo em vista também o quão importante é promover interações que enriqueçam e ampliem as potencialidades das crianças, as rodas de histórias têm presença certa durante o cotidiano. É um dos momentos mais esperados já que a oferta de diferentes textos é variada e exploram diversos assuntos do interesse do grupamento.

Os títulos e outros suportes são levados dentro de uma “bolsa mágica” o que acarreta questionamentos acerca do conteúdo. Antes da retirada dos livros de dentro da bolsa, é disposto um tapete redondo em que as crianças são convidadas a se sentarem seguindo o seu contorno com a finalidade de que todos possam visualizar o conteúdo da bolsa. Para este momento, inicia-se a leitura do livro físico e, em seguida, a mesma história é contada com outro suporte. Normalmente usa-se fantoches de feltro ou objetos do cotidiano para recontar a história.

Por fim, as crianças são convidadas a recontar aos colegas e podem escolher qual suporte desejam utilizar. Fica claro o interesse e prazer em participar desse momento em que são desafiados a recontar as histórias aos colegas.

Logo se faz necessário articular momentos que contemplem diferentes ações em que as crianças possam explorar a função da palavra escrita dentro da prática cotidiana de forma prazerosa sistematizando conhecimentos para uma base ampla de seu repertório linguístico já que, segundo a Base Nacional Comum Curricular, “parte do trabalho do educador é refletir, selecionar, organizar, planejar, mediar e monitorar o conjunto das práticas e interações, garantindo a pluralidade de situações que promovam o desenvolvimento pleno das crianças.”

Visando diversificar e ampliar as alternativas literárias, as crianças são convidadas a experenciar a roda de leitura como um momento de interação com diferentes tipos de textos e interpretações, ação corroborada pela Base Nacional Comum Curricular, que afirma que “as experiências com a literatura infantil, propostas pelo educador, mediador entre os textos e as crianças, contribuem para o desenvolvimento do gosto pela leitura, do estímulo à imaginação e da ampliação do conhecimento de mundo.” (BRASIL, 2018).

À medida que vamos ampliando o repertório, o grupo tende a elencar suas histórias favoritas. Dentre elas, a história do “Vai embora grande Monstro Verde”, de Ed Emberley, se tornou uma das histórias mais esperadas a ser retirada da “bolsa mágica”. Esta leitura aborda a temática do medo, o que traz aos pequenos a possibilidade de interpelar o tema repetidamente e assim formular e nomear o sentimento.

 

Fonte: Acervo pessoal da autora

Em determinado momento da leitura, o monstro vai sendo retirado da história por partes e, quando convidados a mandarem o monstro embora, os pequenos participam com afinco e propriedade, já que é a possibilidade de explorar o sentimento e o que podemos fazer em relação a ele. 

Levando em consideração a importância de incentivar o gosto pela leitura, a contação de história acontece sempre com o intuito de ampliar o repertório do grupo, mas também revisitando os títulos que se tornaram preferência. Paulo Freire nos diz que a leitura do mundo precede a leitura da palavra escrita e, nesse movimento, ambas fortalecem uma à outra.

Neste contexto em que as crianças bem pequenas estão inseridas, geralmente o primeiro ambiente fora do contexto familiar é a escola, logo temos a função de fornecer ferramentas potentes em que o contexto imagético seja uma fonte de aprendizado diário.

Por este motivo, a função da palavra escrita se torna fundamental e de total relevância no contexto da Educação Infantil, já que, desde a mais tenra idade, os pequenos convivem com o mundo letrado, o que fomenta a veracidade de que nas salas de educação Infantil devemos contextualizar e mostrar diariamente a função social da escrita em nossa sociedade.

Para isso, usamos as interações do cotidiano como propulsoras de registros diários junto as crianças bem pequenas. Antes das rodas de leitura, usamos o “papel mágico” para elencar as histórias que o grupo gostaria de ouvir e recontar aos colegas naquele dia. Claro que um título novo sempre é apresentado com intuito de fornecer mais bagagem e, assim, explorar novos contextos.

Fonte: Acervo pessoal da autora

O objetivo aqui, é mostrar que de forma lúdica e simples a vivência da leitura e escrita na educação infantil é viável e necessária. Não num sentido de alfabetizar, mas numa perspectiva de apresentar a função social de ambas aos pequenos.

Isso ocorre quando se propõe essa vivência diária, num contexto em que a criança seja protagonista em suas experiências, sem que exista uma obrigatoriedade no que esteja certo ou errado na estrutura do que está sendo construído pelos pequenos.

Segundo Madalena Freire (2007), “é fundamental que as crianças tomem consciência de que elas estão fazendo, conquistando, estão se apropriando do seu processo de conhecimento”. O que vale, portanto, é a tentativa e as possibilidades de investigar e se apropriar da leitura, da escrita e sua função social.

Luiza Fernanda Dias dos Santos

Pós-Graduação em Educação Inclusiva. Normal Superior no InstitutoSuperior de Educação Pró Saber. Atuou como agente de Educação Infantil. Em 2019, fez o novo concurso para Professor Adjunto de Educação Infantil. Atualmente lotada na E/CRE (07.16.612) Creche Municipal Tia Auta.

REFERÊNCIAS

BRANDÃO, Ana Carolina Perrusi; ROSA, Ester Callad de Sousa (org.). Ler e escrever na educação infantil: discutindo práticas pedagógicas. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2011. (Língua Portuguesa na Escola; 2).


BRASIL. Ministério da Educação. Base nacional comum curricular: educação é a base. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2018. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/. Acesso em: 29 ago. 2022.


BRASIL. Ministério da Educação. Orientações curriculares nacionais para a educação infantil. Brasília, DF: Ministério da Educação, 2010. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/. Acesso em 29 ago. 2022.


FREIRE, Madalena. A paixão de conhecer o mundo: relato de uma professora. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.


FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. São Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989.


SOARES, Magda. Alfaletrar: toda criança pode aprender a ler e escrever. São Paulo: Contexto, 2021.

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